Agradecimentos

Em meio a pandemia de COVID-19 nos deparamos com uma diminuição importante no volume de atendimentos ambulatoriais e cirurgias, então aproveitamos o tempo ocioso para atividades teóricas, e assim surgiu a ideia de escrever um manual prático sobre DII.

Nosso agradecimento especial aos pacientes que permitiram ser fotografados e os que nos disponibilizaram fotos tiradas por eles mesmos para colaborar com o manual.

Todas as fotos são de acervo pessoal da Dra. Magaly Gêmio Teixeira.

Tratamento Cirúrgico da DII

Conteúdo

Via de acesso

Laparoscópica x cirurgia aberta: ambas as vias de acesso podem ser utilizadas e dependem da habilidade do cirurgião. Provavelmente, no futuro a robótica será uma opção.

O melhor momento para operar

O melhor momento para operar é quando o paciente está em bom estado geral antes de desenvolver distúrbios nutricionais, metabólicos e hidroeletrolíticos. Deve-se deixar claro que o tratamento cirúrgico não é curativo e que 50% dos pacientes podem necessitar de uma nova cirurgia ao longo do tempo.

Como preparar o paciente

No momento da indicação cirúrgica, é fundamental uma análise completa sobre o quadro clínico do paciente.

Uma parcela significativa dos pacientes com indicação cirúrgica é desnutrida e necessita de acompanhamento nutricional, a fim de que tenha melhor resposta pós-operatória. Além disso, devemos também atentar para correção de anemia e distúrbios hidroeletrolíticos e metabólicos.

Pacientes que fizeram uso crônico de corticosteroides nos 6 meses que antecedem a cirurgia devem receber a medicação no pré, intra e pós operatório, quando deve ser descontinuada de maneira gradual.

Imunossupressores, em sua maioria, podem ser descontinuados no pré-operatório imediato sem sequelas negativas.

A grande controvérsia é em relação aos imunobiológicos, cujos resultados de estudos são conflitantes em relação ao seu uso no pré-operatório frente a complicações pós-operatórias. No nosso serviço, não associamos o uso destas medicações com complicações pós-operatórias.

O paciente sempre deve ser alertado quanto a possibilidade de estomas. Quando a estomia está previamente indicada. a estomatoterapeuta deve avaliar o paciente e demarcar o melhor lugar para realização da mesma, a fim de diminuir riscos de complicações e melhorar a qualidade de vida.

Não é rotina no nosso serviço realizar preparo intestinal, exceto se cirurgia videolaparoscópica.

Antibióticoterapia em todos os pacientes.

Profilaxia de TVP: Meias elásticas, botas pneumáticas e anticoagulantes.

Não utilizamos sonda nasogastrica e drenos.

Pós operatório:

O momento ideal para reintrodução da dieta depende do cirurgião e dos achados intraoperatórios.

Deambulação precoce, fisioterapia motora e respiratória.

 

 

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Seguimento do Tratamento Clínico

Para todos os pacientes deve-se realizar acompanhamento com exames laboratoriais e de imagem para seguimento da doença.

De acordo com as orientações da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, os pacientes que pegam medicações pelo SUS devem obrigatoriamente apresentar a cada 3 meses urina 1, TGO, TGP e creatinina.

Outros exames podem ser solicitados para avaliar quadros de anemia ou outras alterações provenientes da doença ou do uso crônico de medicações, portanto um seguimento laboratorial mais completo deve ser realizado periodicamente.

Referencia

http://www.saude.sp.gov.br/ses/perfil/gestor/assistencia-farmaceutica/medicamentos-dos-componentes-da-assistencia-farmaceutica/links-do-componente-especializado-da-assistencia-farmaceutica/consulta-por-medicamento/

 

 

 

Acompanhamento endoscópico na colite inflamatória

 

DC: se a doença for limitada ao delgado, a colonoscopia deve ser indicada como orientado na população em geral, sem necessidade do exame anual.

RCU: se o paciente tiver proctite, fazer apenas retossigmoidoscpia para acompanhamento, e colonoscopia como na população geral.

DC localizada no colón ou RCU universal: após os 7 anos do diagnóstico a recomendação é realizar colonoscopia anualmente. Em caso de pacientes jovens e assintomáticos, podemos aumentar esse intervalo, diferente de pacientes idosos, que devem seguir a recomendação anual.

Caso o paciente apresente displasia em algum momento, repetir a colonoscopia em 6 meses. Se a displasia for de alto grau considerar tratamento cirúrgico.

 

Sugestões de leitura:

  • Cannon J. Colorectal Neoplasia and Inflammatory Bowel Disease. Surg Clin North Am. 2015;95:1261-vii. [ resumo ]

 

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Tratamento Clínico da Retocolite Ulcerativa

 Conteúdo

 

Introdução

 

Extensão da doença

DISTAL:   compreende a maioria dos casos. Caracteriza-se por urgência evacuatória, maior frequência das evacuações com sangue e muco e tenesmo. Pode progredir para pancolite. Malignização semelhante a população em geral.

Figura 61. Proctite distal

COLITE ESQUERDA: Caracteriza-se por urgência evacuatória, maior frequência das  evacuações  com  sangue  e  muco, tenesmo, anemia, fadiga, perda de peso, anorexia.

Risco de câncer pouco aumentado em relação a população em geral. Pode associar-se  a  manifestações  extra  – intestinais e  progredir  para  pancolite.

Figura 62. Colite esquerda

PANCOLITE

Caracteriza-se por anemia, fadiga, febre, perda de peso, dor abdominal, distensão abdominal, urgência, frequência  evacuatória, tenesmo. Pode   evoluir para megacolon  tóxico e associar – se  a  manifestações  extra – intestinais

Risco de câncer maior que na população em geral.

Figura 63. Pancolite

 

Transplante fecal

 

Consiste na infusão de microrganismos da microbiota de um individuo saudável em doente afim de reduzir a atividade pro inflamatória devido a mudança, mesmo que temporária, na microbiota do receptor, causando supressão do sistema imunológico, modulada por esses microrganismos.

 

Sugestões de leitura:

  • Gutin L, et al. Fecal microbiota transplant for Crohn disease: A study evaluating safety, efficacy, and microbiome profile. United European Gastroenterol J. 2019;7:807-814. [ texto completo ]
  • Wang H, et al. The Safety of Fecal Microbiota Transplantation for Crohn’s Disease: Findings from A Long-Term Study. Adv Ther. 2018;35:1935-1944. [ texto completo ]

Doença inflamatória  intestinal (DII) e  transplante hepático

A evolução da DII pós transplante hepático por colangite esclerosante (CE) é pouco conhecida. A frequência de DII é baixa. Os casos de associação com CE são menos frequentes e destes, apenas uma parcela necessitará de transplante hepático. Para se avaliar o comportamento da doença pós transplante é necessário seguimento a longo prazo, pouco disponível até o momento.

Aproximadamente 70%-80% dos pacientes com colangite esclerosante primária vão desenvolver DII, especialmente retocolite ulcerativa. A colangite esclerosante vai ocorrer em 2%-8% dos pacientes com RCU e em 1%-3% dos pacientes com Crohn.

A evolução da DII pós transplante hepático é muito variável. Em revisão de 14 estudos, foi observado que apesar da imunossupressão pós transplante, 30% dos pacientes com DII prévia pioraram, 39 % mantiveram-se inalterados e 31 % melhoraram. Pós transplante 14%-30% dos pacientes apresentaram DII de novo. Os fatores de risco permanecem desconhecidos.

Sugestões de leitura:

 

 

 

Outros tratamentos

 

O transplante de intestino pode ser considerado em pacientes com doença de Crohn extensa e refrataria aos tratamentos tradicionais, porem deve se ter em mente a alta taxa de mortalidade e perda do enxerto.

Outra opção para casos refratários aos tratamentos convencionais é o transplante de medula que se mostrou eficaz em alguns casos por agir diretamente no sistema imunológico, porém ainda deve ser feito como protocolo de pesquisa devido a fraca evidencia cientifica, pois não está livre de complicações e tem uma alta taxa de recidiva após 2 anos.

Tratamento alternativo

Cannabis sativa

Fonte de mais de 60 compostos aromáticos, canabióides.  Benéfica para  o  controle  dos  sintomas, mas faltam  evidencias  quanto  a inflamação, evolução da estenose e progressão da doença intestinal. Os estudos falham quanto ao número de pacientes, falta de padronização e inconsistência das dosagens, uma vez há variedade de plantas com diversidade de componentes ativos.

Pode ocorrer adição principalmente em jovens, déficits de  memoria redução  de  QI, risco  de  acidentes e de  aumento  progressivo  de  dose  em  doentes  graves pelo  desconhecimento  de  efeitos  colaterais

 

Curcuma longa

Amplo espectro de efeitos  farmacológicos incluindo anti – inflamatórios, anti – tumorais e  anti – infecciosos. Poucos estudos publicados com resultados interessantes e poucos efeitos colaterais e na  modulação  da  inflamação  ainda  mal  definidos, no entanto, parece  influenciar  múltiplas  moléculas  de  sinalização por inibição do  NF-Kappa b,  exerce atividade anti- inflamatória por  ligar – se  diretamente  a  moléculas pró-inflamatórias  como  TnF alfa, ciclooxigenase,   cox-1, cox-2, glicoproteína ácida humana α1 agp, proteína de  diferenciação mieloide  2   (md-2)

Extrato de Andrographis paniculate

Drogas botânicas: ingredientes extraídos de plantas mas não purificados.

Necessita de prescrição

  1. paniculata extract (APE) aguarda liberação do FDA

Atividade inibitória contra TNF- α, IL-1Β e NF-ΚB in vitro.

 

Sugestões de leitura:

  • Degenhardt L et al. epidemiological patterns of extra-medical drug use in the united states: evidence from the national comorbidity survey replication, 2001-2003. Drug Alcohol Depend. 2007;90:210–23.
  • Gupta sc et al. Multitargeting by curcumin as revealed by molec-ular interaction studies. Nat Prod Rep. 2011;28:1937–55.
  • Henit Yanai et al. Curr Gastroenterol Rep (2016) 18:62
  • Hopfer CJ et al. a genome-wide scan for loci influencing adolescent cannabis dependence symptoms: evidence for linkage on chromosomes 3 and 9. drug alcohol depend. 2007;89:34–41.
  • Mehmedic Z et al. Potency trends of delta9-thc and other cannabinoids in confiscated cannabis preparations from 1993 to 2008. J Forensic Sci. 2010;55:1209–17.

 

Seguimento do Tratamento Clínico

Para todos os pacientes deve-se realizar acompanhamento com exames laboratoriais e de imagem para seguimento da doença.

De acordo com as orientações da Secretaria de Saúde do Estado de São Paulo, os pacientes que pegam medicações pelo SUS devem obrigatoriamente apresentar a cada 3 meses urina 1, TGO, TGP e creatinina.

Outros exames podem ser solicitados para avaliar quadros de anemia ou outras alterações provenientes da doença ou do uso crônico de medicações, portanto um seguimento laboratorial mais completo deve ser realizado periodicamente.

Referencia

http://www.saude.sp.gov.br/ses/perfil/gestor/assistencia-farmaceutica/medicamentos-dos-componentes-da-assistencia-farmaceutica/links-do-componente-especializado-da-assistencia-farmaceutica/consulta-por-medicamento/

 

Acompanhamento endoscópico na colite inflamatória

 

DC: se a doença for limitada ao delgado, a colonoscopia deve ser indicada como orientado na população em geral, sem necessidade do exame anual.

RCU: se o paciente tiver proctite, fazer apenas retossigmoidoscpia para acompanhamento, e colonoscopia como na população geral.

DC localizada no colón ou RCU universal: após os 7 anos do diagnóstico a recomendação é realizar colonoscopia anualmente. Em caso de pacientes jovens e assintomáticos, podemos aumentar esse intervalo, diferente de pacientes idosos, que devem seguir a recomendação anual.

Caso o paciente apresente displasia em algum momento, repetir a colonoscopia em 6 meses. Se a displasia for de alto grau considerar tratamento cirúrgico.

 

Sugestões de leitura:

  • Cannon J. Colorectal Neoplasia and Inflammatory Bowel Disease. Surg Clin North Am. 2015;95:1261-vii. [ resumo ]

 

 

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Tratamento Clínico da Doença Inflamatória Intestinal

Conteúdo

  • Introdução
  • Objetivos do tratamento clínico
  • Correção de distúrbios nutricionais e hidroeletrolíticos
  • Principais medicamentos utilizados no tratamento das DII
  • Indicação de gravidade e de progressão da doença
  • Algoritmo para doença fistulizante perianal no nosso serviço

Introdução

Apresenta muitas dificuldades. Como a etiologia permanece desconhecida, o tratamento específico é inexistente. As DII evoluem por surtos espontâneos de exacerbação e remissão o que dificulta a avaliação dos medicamentos utilizados. Para completar, há multiplicidade de manifestações clínicas o que gera conflitos no tratamento. Assim, por exemplo, a osteoporose pode ter sua velocidade de instalação diminuída com a prescrição de cálcio, que por sua vez, pode favorecer o aparecimento de nefrolitiase nestes pacientes já propensos a esta complicação. Pacientes com dosagem baixa de vitamina D, não devem receber orientação para tomar sol, principalmente se estiverem usando azatioprina pelo risco de tumor de pele. Portanto, ao se prescrever qualquer medicação a estes pacientes, sempre devemos levar em consideração todas as possíveis comorbidades presentes, efeitos colaterais e interação medicamentosa.

Objetivos do tratamento clínico

  • Redução rápida dos sintomas
  • Promover cicatrização das lesões intestinais
  • Evitar aparecimento de complicações
  • Possibilitar retirada dos corticosteroides
  • Melhorar a qualidade de vida
  • Ausência de efeitos colaterais
  • Administração fácil
  • Custo razoável
  • Sucesso a longo prazo
  • Evitar recorrência pós tratamento cirúrgico

Tratamento  da DII depende

  • idade de inicio da doença
  • extensão acometida
  • gravidade
  • resposta inicial ao tratamento
  • resposta após tempo adequado para a medicação prescrita apresentar resultado (ausência de cicatrização da mucosa)
  • efeitos colaterais dos medicamentos ou intolerância aos mesmos
  • manifestações extra – intestinais
  • situações especiais (gestação, amamentação)
  • comorbidades
  • adesão

A adesão é a parte mais difícil de ser obtida no tratamento. A quantidade de medicamentos que um paciente com doença moderada a grave necessita é grande. O efeito não é tão milagroso como o paciente desejaria. Estes fatores levam muitos pacientes a não aderir ao tratamento e a procurar alternativas nem sempre embasadas cientificamente.

Vejam aqui quantos comprimidos um paciente hipotético poderia ter que tomar para obter o controle sintomático de sua doença em um ano, excluindo-se os biológicos.

Dia Ano
PROTETOR GÁSTRICO 1 – 2 365  – 730
5-ASA 8 2920
ÁC. FÓLICO 1 365
COMPLEXO VITAMÍNICO 1 365
AZATIOPRINA 2 – 4 730 – 1460
CORTICOSTERÓIDE 1 – 2 365 – 730
VITAMINA D 1 365
CÁLCIO 1 365

TOTAL / ANO:   6.935 – 8.395

SUPOSITÓRIOS:  1 ao dia; 365 / ano

 

Além de outros: analgésicos, antiespasmódicos, loperamida, colestiramina, antidepressivos, antibioticoterapia  eventual e suplementos nutricionais

 

 

 

Correção de distúrbios nutricionais e hidroeletrolíticos

Sintomas como mal-estar e letargia podem estar relacionados a alterações hidroeletrolíticas que devem ser identificadas e corrigidas. Em doentes com dor abdominal é fundamental ter em mente que as manifestações extra intestinais (cólica biliar, calculo renal) podem causar sintomas e devem ser diferenciadas dos sintomas provocados pela doença intestinal. O paciente pode apresentar ainda consequências dos medicamentos prescritos: epigastralgia, úlcera duodenal, etc

A diarreia de pequena intensidade pode ser tratada com fosfato de codeína ou loperamida.

A absorção dos sais biliares está alterada nos doentes com envolvimento macroscópico do íleo distal ou após ressecção extensa do íleo. Sais biliares não absorvidos se acumulam no cólon onde atuam como catárticos por indução da secreção do sódio e água, que leva à diarreia aquosa acompanhada de urgência. A colestiramina na dose de quatro gramas, ingerida como dose única ou dividida em duas, quela os sais biliares e reduz a diarreia aquosa. Este tratamento pode induzir a esteatorreia secundária, que é pouco sintomática.

 

Dieta

A alimentação pode auxiliar no controle dos sintomas como diarreia, dor abdominal, distensão, assim como deve prevenir ou reverter a perda de peso, podendo ser utilizados suplementos nutricionais adequados. A dieta deve ser hipercalórica, pelo aumento das necessidades energéticas em decorrência da inflamação (30 a 35 kcal/kg/dia), hiperproteica (1,5 a 2,0g/kg/dia), hipolipídica (menos de 20% das calorias totais) e normoglicídica com restrição de carboidratos simples e alimentos que causam flatulência.

Nos casos em que a dieta oral não é opção, podemos usar mão de outros meios.

Dieta enteral.

Está indicada na impossibilidade do paciente receber nutrientes por via oral (ex: DC esofágica, lesões orais extensas)

É mais fisiológica, podendo ser um auxilio na recuperação destes doentes, por ter aportes adequados de nutrientes e calorias. O estudo comparativo entre as dietas elementares e o uso da prednisolona demonstrou resultados similares a curto prazo. No entanto, é necessário considerar a baixa aderência ao tratamento nutricional a longo prazo.

 

Dieta parenteral:

Indicação: doentes graves, desnutridos, que precisam ser rapidamente preparados para cirurgia, presença de múltiplas fistulas entero cutâneas.

 

Sugestões de leitura:

  • Jensen GL et al. GLIM Criteria for the Diagnosis of Malnutrition: A Consensus Report From the Global Clinical Nutrition Community. JPEN J Parenter Enteral Nutr. 2019;43:32-40.
  • Shiroma GM et al. Nutrition quality control in the prescription and administration of parenteral nutrition therapy for hospitalized patients. Nutr Clin Pract. 2015;30:406-413.

 

 

Principais medicamentos utilizados no tratamento das DII

Sulfasalazina

A sulfasalazina é formada pela associação do ácido 5-amino salicílico (5-ASA) com a sulfapiridina. Setenta por cento da sulfassalazina chega ao cólon, onde ocorre a rutura da ligação azo que une as duas moléculas. Para que ocorra esta rutura é indispensável a presença das bactérias colônicas.

A sulfapiridina seria a responsável pelos efeitos colaterais do medicamento que impedem seu uso em 16% dos pacientes. Os efeitos tóxicos podem estar relacionados à dose, tais como, náusea, vômitos, dor de cabeça, mal estar e hemólise, ou serem idiossincrásicos, tais como, febre, reação cutânea, linfadenopatia, agrunolocitose, pneumonite, hepatite e infertilidade masculina por oligospermia. A queda na contagem de glóbulos brancos é súbita com recuperação em uma a três semanas após suspensão do medicamento. Pode ocorrer hipoplasia ou aplasia da medula óssea na série mielóide.

Como seu efeito depende da presença do cólon, não faz sentido prescrever este medicamento para pacientes que tenham ileostomia ou que tenham sido submetidos a colectomia total

Comprimidos de 500mg de 2 a 4g por dia.

 

 

 

 

 

 

 

 

Mesalazina

O 5-ASA (mesalamina) pode ser administrado por via oral, desde que protegido

por resina acrílica ou em microesferas que se dissolvem em pH adequado. Se administrado sem proteção seria absorvido pelo estomago e não teria efeito. A resina acrílica dissolve-se em pH>6, liberando o 5-ASA no íleo distal e no cólon. Este tipo de formulação tem distribuição mais restrita e, eventualmente se o pH estiver mais baixo do que no intestino normal, o que pode ocorrer na doença inflamatória intestinal, o medicamento poderá não se dissolver. Se o paciente estiver com diarreia intensa, o comprimido poderá ser eliminado inteiro.

Deve-se tomar cuidado ao prescrever este medicamento em casos de doença de Crohn acometendo também o intestino delgado com áreas de estenose. O medicamento poderá ficar retido e o paciente apresentará quadro de obstrução intestinal.

Figura 57. Quadro de suboclusão por retenção de comprimidos de mesalazina.

Figura 58. Obstrução intestinal por comprimidos de mesalazina

Esta forma de medicamento pode ser administrada por via oral em comprimidos de 400, 800 e 1200 mg, sob forma retal de 500 mg

Mesalazina MMX- tecnologia que permite a distribuição da substancia ativa ao longo do cólon. A administração pode ser feita 1x /dia . Comprimidos de 1200 mg. O inicio dos sintomas é observado a partir do 14 º dia de tratamento.

Outra forma de liberação lenta em microesferas libera o 5-asa do duodeno ao reto de forma contínua , sem picos de concentração, evitando risco de obstrução em casos de estenose .

Esta formulação de 5-ASA pode ser administrada por via retal, sob a forma de supositórios, de 1 g, nos casos de proctite, ou enema quando o acometimento for mais extenso. Pode ser administrado por via oral na forma de sache de 1 ou 2 g ou comprimidos de 500 mg.

Corticosteróides

Estão indicados na fase aguda da doença, devendo ser retirados tão logo haja melhora do quadro clínico, devido a seus efeitos colaterais. Os mais importantes incluem aparência cushingóide, alterações hidro-eletrolíticas, hipertensão arterial, susceptibilidade maior às infecções, catarata, osteoporose, osteonecrose e miopatia.

Figura 59. Aspecto cushingóide

A dose é variável de acordo com o peso do paciente e condições clinicas. São administrados por via oral e, quando o paciente está internado, por via venosa.

O tratamento a longo prazo associa-se a maior necessidade de tratamento cirúrgico, alta incidência de complicações graves e mortalidade aumentada.            Corticosteroides tópicos são amplamente utilizados e considerados efetivos no tratamento de doentes com colite distal.

Várias formulações de corticosteroides têm sido desenvolvidas com o objetivo de diminuir os efeitos colaterais. Dentre elas, a que permaneceu em uso clinico foi a budesonida (entocort@).  Pós administração oral é liberada a partir do  jejuno  proximal sendo rapidamente  metabolisada  no  fígado e células epiteliais intestinais.

90 % da budesonida  V.O.  resulta em 10% – 15% de  biodisponibilidade

88 % da budesonida  sistemica  disponível  liga – se  a  proteínas  plasmáticas.

Comprimidos de 3 mg. Dose inicial 3cp/dia

Também em forma de enema, não disponível em nosso meio.

Azatioprina e 6-MP

A azatioprina é uma prodroga, sendo convertida a 6-mecaptopurina, a qual é ativada após vários passos, em metabólitos ativos, 6 tioguaninas nucleotídeos. Os efeitos destes medicamentos dependem do genótipo da TPMT (tiopurina metil transferase) que atua no metabolismo das mesmas.

Estudos não controlados demonstraram o fechamento das fístulas e a menor necessidade dos corticosteroides, no tratamento na doença de Crohn.

O início de sua ação demora de três a seis meses, com grande possibilidade de recidiva dos sintomas com a parada da administração.

Os efeitos colaterais incluem, depressão de medula óssea, pancreatite, reações alérgicas e neoplasias.

A dose preconizada de azatioprina é de 2,0 a 2,5 mg por quilograma de peso por dia e de mercaptopurina de 1,0 a 1,5 mg/kg/dia.

 

 

Metotrexate

O metotrexato começa a fazer efeito em torno de seis semanas. A dosagem preconizada é de 15 – 25 mg administrados por via intra-muscular uma vez por semana, durante 12 semanas. Também pode ser administrada na dose de 12 mg/semana por via oral.

Os efeitos colaterais observados incluem náusea, diarreia, alteração dos testes de função hepática e leucopenia. O medicamento é teratogênico e deve ser administrada juntamente com medidas anticoncepcionais em pacientes em fase de reprodução.

 

Ciclosporina

A ciclosporina é imunossupressor específico do linfócito “T”, usado no tratamento dos doentes transplantados.

Os resultados preliminares com o uso da ciclosporina sugeriam resposta rápida uma a três semanas após o início do tratamento. Na doença de Crohn tem absorção irregular. Quando se passa da terapia endovenosa para a oral, as recidivas são frequentes. Outras desvantagens são o alto custo, absorção irregular, toxicidade e, acima de tudo, o fato de ocorrer recidiva imediata com a suspensão da medicação. Pode ser útil no tratamento do megacólon tóxico.

 

 

Tacrolimo

Além de bom imunossupressor, sua absorção por via oral é boa mesmo na presença de acometimento intestinal proximal. Está indicado quando outros medicamentos não surtiram efeito, em pacientes com doença resistente aos corticosteroides e na doença perianal.

Antibióticos

Os trabalhos com antibióticos são poucos, em geral com pequeno número de pacientes e nem sempre incluindo um grupo placebo. No entanto, parece haver consenso de que realmente podem ser úteis no tratamento.

Ciprofloxacino

É um derivado quinolônico, bactericida com efeito mínimo sobre a flora anaeróbica intestinal com pouca emergência de resistência. Resultados favoráveis com o emprego de ciprofloxacino têm sido descritos na literatura, associados ou não a metronidazol . Em nossa experiência, é particularmente útil na doença perianal, e nos casos que não respondem a outros medicamentos.  Deve ser utilizado por período mínimo de três meses. Na recidiva dos sintomas, pode ser reutilizado.    .

Metronidazol

O metronidazol é anaerobicida e apresenta atividade imunossupressora. Pode exercer sua ação pelo efeito antimicrobiano na flora intestinal e como antibiótico sistêmico.

Seus efeitos terapêuticos podem ser avaliados pela cicatrização da doença perianal e diminuição da sintomatologia. Os efeitos colaterais não são importantes, exceto se aparecerem sinais de neuropatia periférica que obrigam a sua suspensão.

Quando a resposta à sulfassalazina não é adequada, pode-se fazer a substituição por metronidazol, mas não vice-versa. É particularmente indicado no tratamento da infecção secundária na doença de Crohn perianal.

Probióticos

Probióticos são definidos como organismos vivos de origem humana, que quando ingeridos alteram a flora entérica, resultando em benefício à saúde por melhorar ou prevenir doenças. Seu uso é controverso. Embora se acredite que possam desempenhar algum papel no tratamento da DII, nenhum resultado foi ainda claramente demonstrado.

 

Biológicos

Uma grande proporção de pacientes requer uma terapia mais efetiva tanto para os episódios agudos com para evitar as recidivas. O recente conhecimento de biologia celular e molecular permitiu o desenvolvimento de compostos biológicos que são usados para atingir seletivamente um alvo específico. Os biológicos a disposição do mercado brasileiro são os seguintes:

Infliximabe- Remicade      Biosimilar Remsima

As principais indicações são presença de doença perianal, falta de resposta a outros medicamentos, dependência de corticosteróides, pioderma gangrenoso, manifestação articular. Devido à rápida cicatrização que promove contraindicamos em doentes com estenose grave e dilatação a montante pelo risco de obstrução aguda, obrigando a intervenção cirúrgica de urgência. Outras contraindicações, são sepse e tuberculose. Em nossa experiência, o infliximabe associou-se a baixo índice de efeitos colaterais.

É importante avaliar os pacientes quanto a falta de resposta ao tratamento convencional e a probabilidade de evoluírem mal, quando este medicamento poderia ser utilizado como primeira opção.

Anti-TnF  ampola de 100 mg

Indicação: DC e RCU

Indução- 5 mg/Kg  EV nas semanas 0, 2 e 6.

Manutenção: 2/2 meses

Na perda de resposta, é possível reduzir o intervalo de aplicação para 1 mês ou aumentar a dose para 10 mg/kg de peso

 

Adalimumabe- Humira  Abbvie

As indicações e a resposta clinica são similares às do infliximabe

Anti-TnF  seringa de 40 mg e 80 mg

Indicação: DC e RCU

Indução- 160 mg na semana 0,  80 mg na semana 2 e a seguir

Manutenção 1 seringa 40 mg 2/2 semanas

Na perda de resposta, é possível reduzir o intervalo de aplicação para 1 semana

 

Certolizumabe – Cimzia – UCB

Anti-TnF

Indicação: DC e RCU

Indução- 2 injeções de 200 mg , semana  0, 2 e 6 SC.

Manutenção; 400 mg 4/4 semanas

 

Vedolizumabe – Entyvio  anti-integrina

Anticorpo monoclonal anti integrina α4β7, foi aprovado para RCU e DC moderada a grave com resposta inadequada, perda de resposta ou intolerância ao tratamento convencional

Age especificamente na mucosa intestinal

Segura para usar por longos períodos e induz um longo período de remissão (12-16 sem)

Não é recomendado para induzir uma resposta rápida, pois o melhor efeito é tardio

ECCO -> recomenda para resposta inadequada a imunossupressores.

Pode ser considerado em pacientes com comorbidades e alto risco de infecção ou com histórico para malignidade.

Indicação:DC e RCU

Indução- 300 mg ev ( 30 minutos) em 0, 2 e 6 semanas

Manutenção 300 mg ev 8/8 semanas

 

Ustekinumabe – Stelara inibidor da IL12/23

 

Anticorpo monoclonal IgG1 age no p40 nas IL-12 e IL-23 nas células T-helper, sendo especifico para células intestinais. Aprovado para o tratamento de paciente com DC moderada a grave e falência ou intolerância ao tratamento convencional

Melhor resposta com paciente TNF NAIVE (54-58% – 34%)

ECCO e AGA aprovaram o tratamento com Ustekinumabe para pacientes NAIVE

Indicação:DC e RCU

Indução: até 55 kg  2 frascos 130 mg/26 ml concentração 5 mg/ml EV

De 55 a 85 kg  3  frascos

Mais de 85 kg 4 frascos

Adicionar o conteúdo dos frascos a 250 ml SF 0,9% em 1 hora descontando o volume do Stelara

Manutenção: na semana 8 iniciar com 1 seringa preenchida com 90 mg/em 1 ml  SC   Repetir 8/8semanas SC.

 

XELJANZ-tofacitinibe –Pfizer

Indicação: RCU moderada a grave

anti JAK/STAT  – VO- cp=5 mg

Indução:10 mg VO 2x/dia por 8 semanas

Manutenção: 5 mg VO 2X/DIA

 

 

Indicação de gravidade e de progressão da doença

 

Diagnóstico em jovens; necessidade de corticosteroides no inicio do tratamento, doença que se apresenta como fistulisante ou estenosante por ocasião do diagnóstico, doença gastrointestinal grave, doença perianal, lesões endoscópicas importantes. Na doença de Crohn o tabagismo é fator de agravamento da doença, ao contrário da retocolite ulcerativa.

 

Algoritmo para doença endoluminal

Condutas de outros serviços:

 

ECCO – Budesonida (9mg) é o melhor tratamento para induzir remissão em doença ileocecal leve ativa. (>60% em 8 semanas).

ECCO -Para tratar doença moderada ileocecal – Budesonida ou corticoides sistêmicos

Mesalazina foi usada para induzir remissão por décadas em DC

ECCO – Sugere não usar a mesalazina ou sulfasalazina para tratar DC por falta de dados (5 estudos). No entanto, meta analise publicada no Cochrane demostra significantes benefícios para altas doses (>2.4g) comparado com o placebo.

Mesalazina deve continuar a ser ofertado como opção de tratamento e ofertado em pacientes que se recusam a usar repetidamente doses de corticosteroides e não quer escalonar para terapia com imunossupressores e imunobiológicos.

 

 

Algoritmo para doença fistulizante perianal no nosso serviço

Conhecer a anatomia da fistula é fundamental (RM, USG e exame sob anestesia)

Fistulas complexas: Alta (>2/3esfíncter externo) inter esfinctérica, alta transesfincterica, supra esfinctérica e extra esfinterica.

Toda fistula anterior na mulher é considerada complexa

ECCO: ATB não são monoterapia / recomenda o Infliximabe como primeira escolha / adalinumabe 40%

Ustekinumabe não demonstrou beneficio, quando comparado com o placebo

Tratamento com células tronco pode ser uma opção (80 – 64%)

 

Sugestões de leitura:

  • Abdalla a, Herfarth h.Bbudesonide for the treatment of ulcerative colitis, Expert Opin Pharmacother 2016, 17:1549-1559.
  • Adamina M, et al. ECCO Guidelines on Therapeutics in Crohn’s Disease: surgical Treatment. J Crohn’s Colitis. 2020;14:155–68.
  • Aguilera-Castro L, et al. Management of com- plex perianal Crohn’s disease. Ann Gastroenterol. 2017;30:33–44.
  • Biron C, et al. Efficacy of ustekinumab in perianal Crohn’s disease: the BioLAP multi-centre observational study. Journal of Crohn’s and Colitis, 2019. ECCO oral presentation DOP74.
  • Coward S, et al. Comparative Effectiveness of Mesalamine, Sulfasalazine, Corticosteroids, and Budesonide for the Induction of Remission in Crohn’s Disease: A Bayesian Network Meta-analysis. Inflamm Bowel Dis. 2017: 461–72. 43
  • Gecse KB, et al.; World Gastroenterology Organization, International Organisation for Inflammatory Bowel Diseases IOIBD, European Society of Coloproctology and Robarts Clinical Trials. A global consensus on the classification, diagnosis and multidisciplinary treatment of perianal fistulising Crohn’s disease. Gut. 2014;63:1381– 92.
  • Jones JL, et al. Effects of concomitant immunomodulator therapy on efficacy and safety of anti-tumor necrosis factor therapy for Crohn’s disease: a meta-analysis of placebo-controlled trials. Clin Gastroenterol Hepatol. 2015;13:2233-40. e1-2.
  • Lamb CA, et al.; IBD guidelines eDelphi consensus group. British Society of Gastroenterology consensus guidelines on the management of inflammatory bowel disease in adults. Gut. 2019;68 Suppl 3:s1–106.
  • Lee MJ, et al. Efficacy of Medical Therapies for Fistulizing Crohn’s Disease: Systematic Review and Metanalysis. Clin Gastroenterol Hepatol. 2018;16: 1879–92.
  • Lichtiger S, et al. The CHOICE trial: adalimumab demonstrates safety, fistula healing, improved quality of life and increased work productivity in patients with Crohn’s disease who failed prior infliximab therapy. Aliment Pharmacol Ther. 2010; 32:1228–39.
  • Torres J, et al. ECCO Guidelines on Therapeutics in Crohn’s Disease: medical Treatment. J Crohn’s Colitis. 2020;14:4–22.

 

 

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Orientações pré-tratamento

Conteúdo

Estilo de vida

Tentar manter uma vida mais próxima do normal.

Tabagismo: é fator de risco para DC e agrava o curso clínico da doença, com maiores episódios de recaídas, mais complicações intestinais, maiores taxas de cirurgias e pior resposta ao tratamento clínico, principalmente em mulheres.

Manter uma atividade física regular.

Dieta equilibrada, evitando altos teores de açúcar e gordura.

Ingesta hídrica adequada, principalmente em paciente com episódios de diarreia frequentes.

Manter um acompanhamento médico regular, não fazer uso de medicamentos por conta própria, mesmo que não relacionados à DII e não suspender o uso de nenhuma droga sem antes conversar com seu médico.

Sugestões de leitura:

  • Chen Y, Role of environmental factors in the pathogenesis of Crohn’s disease: a critical review. Int J Colorectal Dis. 2019;34:2023‐2034. [ texto completo ]
  • Piovani D, Danese S. Environmental Risk Factors for Inflammatory Bowel Diseases: An Umbrella Review of Meta-analyses. 2019;157:647‐659.e4. [ resumo ]

Dieta

Muitas vezes os pacientes pedem orientações sobre alimentação e experimentam dietas da moda como forma de tratamento da doença, porém as diretrizes recentes de DII não defendem nenhum tipo específico de dieta por falta de estudos que comprovem eficácia.

Um estudo holandês mostrou que 59% dos pacientes consideram a dieta tão importante quanto o uso das medicações para o controle da doença.

Uma revisão atual da literatura envolvendo algumas dietas populares (dieta sem carboidratos, FODMAPS – Fermentable Oligosaccharides, Disaccharides, Monosaccharides and Polyols, sem glúten, dieta mediterrânea, dieta anti-inflamatória) em DII mostrou que há escassez de dados e pesquisas limitadas. Não se sabe muito sobre o impacto dessas dietas na inflamação a níveis endoscópicos e celulares.

Orientações aos pacientes: falta de evidências dessas dietas em relação às DII, atenção com a exclusão de alimentos e nutriente pois podem levar a carência nutricional. O ideal é usar o bom senso, e avaliar cada paciente de acordo com sua sintomatologia.

Em casos especiais, há a necessidade do uso de dietas enterais e parenterais, e ai sim realizar um acompanhamento com a Nutrologia.

Sugestões de leitura:

  • de Vries JHM, et al. Patient’s dietary beliefs and behaviours in inflammatory bowel disease. Dig Dis. 2019;37(2):131–9. [ texto completo ]
  • Weber AT, et al. Popular Diet Trends for Inflammatory Bowel Diseases: Claims and Evidence. Curr Treat Options Gastroenterol. 2019;17(4):564‐576. [ resumo ]

Vacinas

As DII em si não influenciam na resposta às vacinas, porém pacientes em uso de terapia biológica ou de imunossupressores tem maior risco de infecções graves ou de complicações que seriam evitadas com a imunização preventiva.

Como as DII não são comuns em menores de 5 anos, ao diagnóstico a maioria dos pacientes já estará com o cartão vacinal em dia. Vacinas inativadas são consideradas seguras para pacientes com DII, independente do grau de imunossupressão. A orientação é de administrar essas vacinas pelo menos 2 semanas antes do início do imunossupressor.

Ao diagnóstico da DII deve-se realizar testes sorológicos para hepatites A e B, sarampo, varicela, Epstein-Barr e atualizar o cartão vacinal, de preferência antes do início da terapia imunossupressora, exceto em pacientes com quadro moderado a grave, em que o tratamento deverá ser iniciado o quanto antes.

Atenção para casos de mães que fizeram uso de biológicos durante a gestação, os recém-nascidos não devem ser vacinados com organismos vivos (BCG, rotavírus e poliomielite oral) até o 6º mês.

Vacinas inativadas:

Vacinas atenuadas são contraindicadas em pacientes que fazem uso de imunomoduladores ou biológicos, e devem ser administradas 4 a 6 semanas antes do início do tratamento. Se o paciente já faz uso de alguma dessas medicações, a vacinação deve ser adiada até que ele esteja 3 meses sem sua administração.

  • Influenza: recomendação anual.
  • Pneumococo (pneumonia pneumocócica): Imunodeprimidos: 1 dose de VPC13 (vacina pneumocócica 13-valente conjugada), seguida de 1 dose de VPP-23 (vacina pneumocócica polissacarídica 23 valente) após 8 semanas. Imunocompetentes: 1 dose de VPC13, seguida de 1 dose de VPP-23 após 6 – 12 semanas. Após 5 anos administrar a 2ª dose da VPP-23, e a 3ª dose após 65 anos de idade.
  • Dupla adulto (Tétano e Difteria): A cada 10 anos. Entre 11 – 64 anos, substituir uma das doses uma única vez pela vacina para difteria, tétano e pertussis (acelular).
  • Meningococo: Entre 16 – 23 anos: 2 doses, com 5 anos de intervalo. Adultos: dose única.
  • Hepatite A: Se não imune: 2 doses, a 2ª dose após 6 – 12 meses da primeira.
  • Hepatite B: Se não imune: 3 doses (0, 1 e 6 meses). Se o uso do imunossupressor for imediato, reduzir o intervalo para 0, 1 e 2 meses.
  • HPV (tipos 6, 11, 16 e 18): Entre 9 e 26 anos. Se iniciada entre 9 e 14 anos: 2 doses com intervalo de 6 meses. Se iniciada entre 15 e 26 anos ou em imunossuprimidos: 3 doses (0, 1 e 6 meses).

Vacinas atenuadas:

  • Tríplice viral: Se não imune: 2 doses com intervalo de 30 dias.
  • Varicela: Se adulto não imune: 2 doses com intervalo de 4 a 8 semanas entre elas.
  • Herpes Zoster:   50 – 60 anos: dose única (independente de infecção prévia). Vacinar o doente 4 semanas antes de iniciar biológicos ou tofacitinibe.
  • Febre Amarela: Dose única se não vacinado.

Pacientes com doença moderada a grave, que não tem um cartão vacinal atualizado tem como forma de proteção a vacinação de familiares próximos, para reduzir a transmissão de alguns patógenos.

Sugestões de leitura:

  • Friedman MA, et al. Vaccines and Disease-Modifying Antirheumatic Drugs: Practical Implications for the Rheumatologist. Rheum Dis Clin North Am. 2017;43:1-13. [ resumo ]
  • Meroni PL, et al. Vaccinations in adults with rheumatoid arthritis in an era of new disease-modifying anti-rheumatic drugs. Clin Exp Rheumatol. 2018;36:317-328. [ resumo ]
  • Reich J, et al. Vaccination and health maintenance issues to consider in patients with inflammatory bowel disease. Gastroenterol Hepatol (N Y). 2017;13:717-724. [ texto completo ]

Risco de câncer

Pacientes com DII tem maior risco a longo prazo de desenvolver neoplasias malignas e geralmente com idade mais jovem em comparação com a população geral.

Figura 56. Produto de colectomia total por RCU com câncer de reto

 

O risco maior de CCR está bem estabelecido em pacientes com colite extensa e de longa duração, colangite esclerosante primária ou história família de CCR, tanto na DC como na RCU. Doentes com diagnóstico de CEP também tem taxa maior de colangiocarcinomas.

Em pacientes que não apresentam doença perianal, a incidência de neoplasias de canal anal são as mesmas da população geral, associadas ao HPV, porém em pacientes com DC perianal crônica, o risco de CEC ou adenocarcioma é elevado e está associado a fístulas ou à estenose anorretal.

Neoplasias malignas associadas às medicações:

  • Tiopurinas: câncer de pele não melanoma, distúrbios linfoproliferativos
  • Anti-TNF: linfoma.

Sugestões de leitura:

  • Kappelman MD, et al. Risk of cancer in patients with inflammatory bowel diseases: a nationwide population-based cohort study with 30 years of follow-up evaluation. Clin Gastroenterol Hepatol. 2014;12:265‐73.e1. [ texto completo ]
  • Pedersen N, et al. Risk of extra-intestinal cancer in inflammatory bowel disease: meta-analysis of population-based cohort studies. Am J Gastroenterol. 2010;105:1480‐1487. [ resumo ] 
  • Wisniewski A. Anal Neoplasia in Inflammatory Bowel Disease: Classification Proposal, Epidemiology, Carcinogenesis, and Risk Management Perspectives. J Crohns Colitis. 2017;11:1011‐1018. [ resumo ]

 

Fertilidade, Gestação e Amamentação

A fertilidade é uma grande preocupação para pacientes com DII, já que grande parte deles são jovens em idade fértil.

Os pacientes que tem a doença controlada apresentam taxas de fertilidade semelhantes a população geral, porém há menor taxa de natalidade pela falta de vontade voluntária de ter filhos, causada pelo medo das consequências da doença no feto, a apreensão sobre a fertilidade, resultados adversos da gestação no curso da doença, pelo risco de DII na prole e segurança dos medicamentos.

Alguns estudos avaliaram o impacto da atividade da doença na fertilidade em mulheres e homens, e não há evidências de que as DII controladas afetem a fertilidade, porém nos casos de doença ativa, a inflamação peritoneal pode ser responsável pelas aderências intra-abdominais e, portanto, pela diminuição da taxa de fertilidade. Além disso, pós tratamento cirúrgico, anexite, dispareunia, comprometimento retal, dor abdominal crônica e distúrbios de ansiedade e depressão também podem levar a infertilidade.

 

Medicamentos que interferem fertilidade:

Sulfassalazina e metotrexate: oligoespermia reversível (2 a 3 meses)

– Infliximabe: alguns estudos sugerem que há diminuição na mobilidade espermática.

Adalimumabe, Vedolizumabe, Ustekinumabe – estudos insuficientes.

 

Cirurgias: mulheres com RCU que foram submetidas à bolsa ileal tem um risco aumentado de infertilidade, provavelmente por aderências abdominais e obstruções tubárias. Em caso de cirurgia aberta, a taxa de infertilidade é maior do que por via laparoscópica.

Não há evidências de qualquer impacto da cirurgia de DII na fertilidade masculina, exceto pelo risco de disfunção erétil.         Um estudo mostrou que mulheres com DC em cólon com mais de 30 anos de idade poderiam apresentar uma alteração acelerada da reserva ovariana quando comparadas com mulheres saudáveis.

 

DII, gestação e feto

Não há risco de defeitos congênitos maior nas pacientes com DII, portanto a maioria engravida sem complicações, porém a atividade da doença na concepção ou durante a gestação é considerada um dos fatores de risco mais significativos para um impacto negativo na gravidez e no feto, podendo levar a prematuridade, baixo peso ao nascer.

Na maioria das vezes, a gravidez não influencia o curso da doença.

Deve-se avaliar caso a caso, e sempre que possível manter a terapia se doença ativa ou durante surto de agudização, e quando doença controlada usar apenas as medicações necessárias.

Medicamentos: a maioria dos medicamentos não tem efeito negativo na concepção e na gestação, passam pelo leite materno, mas não tem impacto negativo no bebê.

Corticosteróides: seguros, evitar doses altas, principalmente no 3º trimestre.

Amamentação: seguro, é recomendada a amamentação de 3 a 4 horas após a sua ingestão.

 

5-ASA: seguros, se remissão clínica manter durante gestação.

Sulfassalazina: na gravidez suplementação com ácido fólico.

Amamentação: seguro.

 

Imunossupressores:

AZA e 6-MP: seguros

Amamentação: não são contra indicados, porém usar com cautela.

Metotrexato: não deve ser usado em pacientes que desejam engravidar por ser embriotóxico, aumenta risco de defeitos congênitos, aborto espontâneo e prematuridade. Suspender 6 meses antes de engravidar.

Amamentação: contraindicado.

Ciclosporina e Tacrolimo: faltam evidências. Podem ser considerados no tratamento, porém com cautela.

Amamentação: contra indicados.

  • Anti-TNF:

Infliximabe: seguro, se possível manter durante toda gestação, com atenção a vacinação do bebe.

Amamentação: seguro

Adalimumabe, Golimumabe: estudos insuficientes

  • Outros biológicos: Vedolizumabe, Ustekinumabe – estudos insuficientes.

Atenção com medicações não citadas, como a Talidomida, pois são altamente teratogênicos.

Orientações: planejar a gestação para o período de remissão, já que o curso da doença e o risco de complicações relacionadas à gravidez dependem principalmente da atividade da doença no momento da concepção, e manter o tratamento de manutenção durante a gravidez.

Parto:

A cesárea é recomendada se houver doença perianal ou doença ativa com envolvimento retal.

Avaliar cada caso individualmente.

 

Sugestões de leitura:

  • Leenhardt R, et al. Sexual health and fertility for individuals with inflammatory bowel disease. World J Gastroenterol. 2019;25:5423‐5433. [ texto completo ]
  • Szymańska E, et al. Reproduction and Pregnancy in Inflammatory Bowel Disease – Management and Treatment Based on Current Guidelines [published online ahead of print, 2020 Apr 18]. J Gynecol Obstet Hum Reprod. 2020;101777. [ texto completo ]

 

O que não usar

  • AINE: seu uso está relacionado com a exacerbação da doença desencadeando crises, e em casos de uso excessivo pode levar a uma remissão menos satisfatória.
  • Roacutan (Isotretinoína): não há consenso na literatura, mas alguns estudos mostram relação com as DII, além da sua hepatotoxicidade, portanto no nosso serviço contraindicamos seu uso.

Sugestões de leitura:

 

  • Felder JB. Effects of nonsteroidal antiinflammatory drugs on inflammatory bowel disease: a case-control study. Am J Gastroenterol. 2000;95:1949‐1954. [ resumo ]
  • Prevost N. Isotretinoin: update on controversial issues. J Pediatr Adolesc Gynecol. 2013;26:290-293. [ resumo ]

 

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Diagnóstico Diferencial da DII

O diagnóstico diferencial mais importante é entre DC e RCU. Seguem-se os seguintes: síndrome de intestino irritável (geralmente cursa com exame endoscópico normal, podendo estar associado a DII); colite microcitica (exame endoscópico normal, mas com inflamação microscópica na biopsia); colite eosinofilica (diagnóstico de exclusão, sendo importante demonstrar biopsias cólicas com infiltração eosinofílica de mais de um segmento);  Colite associada a doença diverticular, esquistossomose, polipose familiar e o cancer colorretal entram como importantes diagnósticos diferenciais; colite por Clostridium difficile ( Geralmente associada ao uso de antibioticoterapia, o diagnóstico se dá pela detecção de toxina A e B nas fezes).

Devemos excluir a possibilidade de outras colites infecciosas que geralmente causam diarreias agudas com diferentes mecanismos de ação; Secreção ativa de água e eletrólitos provocada por toxinas (Vibrio cholerae, Escherichia coli enterotoxigenica, Clostridium perfringens e vírus) ou invasão da mucosa (Disenteria) (Shigella sp, Yersinia entorocolítica, Entamoeba sp, Giardia lamblia e Cryptosporidium)

A colite indeterminada corresponde de 5 a 15 % dos pacientes portadores de DII engloba os pacientes submetidos a colectomia total ou proctocolectomia total por quadros de colite acentuada, em geral em operações de emergência e quando, após anatomopatológico, não foi possível o enquadramento em DC ou RCU.

No Brasil, é importante lembrar a tuberculose intestinal como importante diagnóstico diferencial. Além das causas já citadas em pacientes como imunodepressão (HIV) devemos pensar no Sarcoma de Kaposi (podendo afetar todo intestino e com anatomo patológico pouco especifico).

Sugestões de leitura:

 

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Métodos diagnósticos

Conteúdo

Laboratório

Não existem testes laboratoriais para o diagnóstico de DII. Os exames laboratoriais servem apenas para avaliação do estado nutricional, de distúrbios hidroeletrolíticos e metabólicos associados. Antes de iniciar o tratamento, é interessante a avaliação laboratorial do paciente para detectar alterações hepáticas, renais, tireoidianas, deficiências vitamínicas e distúrbios de coagulação.

Vários marcadores sorológicos tem sido descritos, mas até o momento nenhum alcançou o objetivo proposto de compreender efetivamente a heterogeneidade da DII e sua historia natural.

Atualmente, a cicatrização de mucosa tem sido o alvo do tratamento. E o método mais eficaz de monitorização seria a colonoscopia. Porém é procedimento invasivo, o preparo é desagradável, o custo é alto e demanda perda de tempo. A calprotectina fecal tem sido amplamente utilizada com a finalidade de avaliar a atividade da doença, evitando procedimentos endoscópicos de repetição. Apresenta várias vantagens clínicas, como estabilidade em temperatura ambiente, resiste a degradação e tem distribuição homogênea nas fezes. Estudo recente sugere que a calprotectina fecal possa ser útil também para predizer relapso clinico em pacientes adultos com RCU em remissão, com a vantagem de ser simples e não invasiva.

Sugestão de leitura:

Microbiota

Há consenso de que a microbiota intestinal tenha uma participação no desenvolvimento das DII. Pode-se realizar o sequenciamento genético do microbioma intestinal.  Este exame pode mostrar disbiose na DII.  Sua utilidade prática ainda não foi comprovada.

Sugestão de leitura:

Radiologia

  • Radiografia simples de abdome: Fornece poucas informações. Na urgência, pode permitir o diagnóstico de obstrução intestinal, megacólon tóxico e da perfuração intestinal. O cólon transverso no megacólon tóxico exibe diâmetro superior a 5,5 centímetros, ausência das haustrações e contorno irregular da parede colônica.
  •  Enema opaco: Pouco utilizado atualmente. Avalia intestino grosso podendo mostrar extensão da doença, presença de ulceras, áreas de estenose, fístulas, perda de haustrações, microcólon. Um filete de bário preenchendo um segmento de alça intestinal muito estenosado é achado característico da doença de Crohn.

Figura 29. Aumento do espaço retro retal.


Figura 30. Retocolite (colón com perda de haustrações).

  •         Transito intestinal: Avalia intestino delgado. Consiste na ingestão de contraste baritado e sequencia de radiografias para mostrar a progressão do contraste.  Pode fornecer as seguintes informações: velocidade do trânsito intestinal, espessamento e deformidade da parede intestinal, estenoses com ou sem dilatação a montante, trajetos fistulosos. A preferência pelo lado mesentérico do intestino pela doença de Crohn produz uma distribuição assimétrica da imagem radiológica. Esta distensão assimétrica produz o aspecto de dilatação sacular ou de pseudo-divertículo. O aspecto de separação anormal das alças intestinais é produzido em consequência das alterações do tecido adiposo mesenterial, formação de abscesso e reação inflamatória difusa.

Figura 33. DC – fistula entero cólica

  • Fistulografia: Exame complementar para confirmação da presença do trajeto fistuloso, utilizando RX simples de abdome. Uma sonda é introduzida no orifício externo e injetado contraste para visualização do trajeto fistuloso.

Figura 34. Fistula complexa

  • Tomografia computadorizada: Pode mostrar as mesmas alterações que os exames anteriores, além de avaliar outras estruturas abdominais. Permite procedimento terapêutico, como, punção de coleções. Desvantagem: radiação

 

Figura 35. Espessamento de parede

 

  • Entero Tomografia computadorizada: Este exame requer ingestão de contraste oral negativo ou neutro, tais como, água, lactulose, manitol, metil celulose ou polietileno glicol. Fornece dados quanto a doença de Crohn intra e extra-intestinal. Os sinais principais são: espessamento de parede intestinal > 5mm;  realce mucoso da área doente em relação ao intestino normal; sinal do pente representado pelos vasa reta dilatados pelo processo inflamatório; densificação da gordura; aumento dos linfonodos regionais> 5mm; redução de calibre com ou sem distensão a montante; fistula definida como imagem linear com realce periférico conectando duas estruturas anatômicas, com ou sem conteúdo aéreo ou liquido.

No entanto, envolve exposição a radiação e estes doentes podem necessitar de vários exames ao longo da vida. Doses superiores a 100mSV, particularmente em pacientes jovens, são motivo de preocupação com o risco de câncer.

  • Ressonância nuclear magnética (RNM): Exame sem emissão de radiação ionizante com boa acurácia para visualizar todos os aspectos ja citados na Tomografia, em especial, melhor visualização de fístulas nos casos de doença perianal.
  • EnteroRM: A entero ressonância magnética (ERM) fornece dados semelhantes aos obtidos pela ETC, sendo mais efetivo na avaliação da região pélvica. Necessita da ingestão de contraste da mesma forma que a ETC. É exame mais demorado e mais caro. Pacientes claustrofóbicos podem necessitar de sedação. A grande vantagem é a ausência de radiação. Requer administração de gadolineo. Este pode se depositar em várias estruturas como tálamo e não se sabe ainda a significância deste fato a longo prazo.
  • Ultrassonografia: Não requer preparação, é método largamente disponível, operador dependente, mais demorado. Pode demonstrar espessamento e rigidez de alças intestinais e abscessos. Estuda-se a possibilidade de utilizar contraste para determinar a atividade da doença.
  • Elastografia por US: O objetivo do exame seria permitir o diagnóstico diferencial entre inflamação e fibrose.

Sugestões de leitura:

  • Chen Y J, et al. Real-Time Shear Wave Ultrasound Elastography Differentiates Fibrotic from Inflammatory Strictures in Patients with Crohn’s Disease. Inflamm Bowel Dis. 2018 ; 24: 2183–2190 [ texto completo ]
  • Kavanagh RG, et al. Low-Dose Computed Tomography for the Optimization of Radiation Dose Exposure in Patients with Crohn’s Disease. Gastroenterol Res Pract.  2018; 2018: 1768716.  [ texto completo ]
  • Stênio Burlin et al. Using computed tomography enterography to evaluate patients with Crohn’s disease: what impact does examiner experience have on the reproducibility of the method? Radiol Bras. 2017; 50: 13–18. [ texto completo]
  • Taylor AS et al. Diagnostic accuracy of magnetic resonance enterography and small bowel ultrasound for the extent and activity of newly diagnosed and relapsed Crohn’s disease (METRIC): a multicentre trial. Lancet Gastroenterol Hepatol. 2018 ; 3: 548–558.  [ texto completo ]

Endoscópico

Colonoscopia 

A colonoscopia permite avaliação de todo o intestino grosso e íleo terminal , além de coleta de material para estudo anatomopatológico. É útil para diagnóstico, monitorização de resposta terapêutica e rastreamento de neoplasias. Permite ainda procedimento terapêutico, como dilatação de áreas de estenose.

Podem ser encontrados os seguintes aspectos na doença de Crohn: Reto geralmente preservado, lesões salteadas, úlceras aftóides, longitudinais, coalescentes, calcetamento, pólipos inflamatórios, pontes mucosas, estenoses, orifícios fistulosos.

Figura 36. Ulcera longitudinal

Figura 37. Ponte mucosa

Figura 38. Oricificio fistuloso

Na RCU os aspectos mais frequentes são: reto geralmente doente, lesão com gradiente sendo mais intensa no reto e com intensidade decrescente em direção ao ceco, edema, friabilidade, ulceras rasas, apagamento de vascularização submucosa, pólipos inflamatórios.

Figura 39. Aspecto endoscópico

Endoscopia de alta resolução, filtros digitais , cromo endoscopia, endoscopia confocal são avanços que permitem observação de detalhes e detecção de neoplasia intraepitelial.

Endoscopia Digestiva Alta (EDA)

A EDA é mandatória na população pediátrica com suspeita de parada do crescimento e suspeita de DII para diagnóstico diferencial entre DC e RCU e para confirmação de diagnóstico de DC.  Em adultos, deve-se realizar o exame na presença de quadros de dispepsia e vômitos e em pacientes com suspeita de doença celíaca concomitante. Achados sugestivos de DC são edema, eritema, erosões e espessamento das pregas mucosas. Não se deve esquecer que as prevalências de gastrite e duodenite são maiores do que as de DC de TGI alto.

Capsula endoscópica

A capsula endoscópica pode ser útil como método diagnóstico para doença de Crohn.  Deve ser realizada após exclusão de áreas de estenose ou fístulas por outros métodos diagnósticos pelo risco de retenção da cápsula (por mais de 2semanas) ou perfuração.

Figura 40. Capsula endoscópica retida sem causar obstrução

 

Endoscopia de duplo balão

É método mais invasivo, porém permite obtenção de biópsias e dilatação de estenoses.

Retossigmoidoscopia

A retossigmoidoscopia é parte do exame proctológico e deve ser realizada em todos os pacientes.

A inspeção da região perianal pode demonstrar a presença de anus entreaberto, pregas perianais edemaciadas, dermatite, plicomas inflamatórios, fissuras únicas ou múltiplas, fístulas únicas ou múltiplas, lesões ulceradas, abscessos , destruição de esfíncter. Ao toque, avalia-se a tonicidade esfincteriana e presença ou não de irregularidade da mucosa.

A retoscopia geralmente demonstra padrão vascular normal na doença de Crohn e friabilidade, edema, hiperemia na retocolite ulcerativa.. As biópsias realizadas durante o exame ajudam no esclarecimento diagnóstico. Nos casos mais graves, há tubulização do reto e mesmo estenose impedindo a realização do exame.

Exame ginecológico

Importante nos casos de suspeita de fistula para o aparelho genital feminino

As fístulas ano-vaginais são as mais comuns , sendo normalmente baixas e localizadas próximas à fúrcula vaginal e trans-esfinctéricas.  As fístulas reto-vaginais são pouco comuns podendo ser secundárias à inflamação transmural do reto. A presença deste tipo de fístula pode induzir um falso diagnóstico de incontinência fecal.

Figura 41. Manifestações perineais (Acometimento de grandes e pequenos lábios)

 

Figura 42. Acometimento de perineal e raiz de coxa

Sugestões de leitura:

  • Annese V, et al. European evidence based consensus for endoscopy in inflammatory bowel disease. J Crohns Colitis. 2013;7:982-1018. [ texto completo ]
  • Feuerstein JD, Cheifetz AS. Crohn Disease: Epidemiology, Diagnosis, and Management. Mayo Clin Proc. 2017;92:1088-1103. [ texto completo ]
  • Flynn S, Eisenstein S. Inflammatory Bowel Disease Presentation and Diagnosis. Surg Clin North Am. 2019;99:1051-1062. [ texto completo ]

Diagnóstico histopatológico

O diagnóstico das DII é baseado na correlação de dados clínicos, radiológicos, endoscópicos e anatomopatológicos, uma vez que não há achados patognomonicos que possam individualizar estas patologias.

 

Doença de Crohn

Macroscopia

Exame externo: Podem ser vistas estenoses, aderência entre alças, orifícios fistulosos.

Exame interno: úlceras serpiginosas, aftóides, acometimento transmural da parede, calcetamento, pseudopolipos.

Figura 43 Espessamento de meso. Envelopamento do segmento doente pelo tecido gorduroso

Figura 44.  Gânglios aumentados

Figura 45. Trajetos fislulosos

Figura 46. Ulcera longitudinal

Figura 47. Lesões salteadas de Colon

Figura 48. Lesões salteadas de Delgado

Microscopia: Áreas salteadas.  Heterogeneidade do infiltrado linfoplasmocitário. Granulomas. Agregados linfoides na submucosa. Hipertrofia de nervos.

Figura 49. Granuloma

Figura 50. Fissura transmural

 

Retocolite Ulcerativa

Macroscopia

Exame externo: normal exceto em megacólon tóxico ou associação com neoplasia

Exame interno:  transição entre área doente e normal é abrupta. Na área doente as lesões são continuas. Encontram-se úlceras, ppseudopolipos e pólipos inflamatórios. Perda total da mucosa em casos muito graves. Cólon encurtado sem haustrações.

 

Figura 51. Acometimento continuo

Figura 52. Gradiente de acometimento

Figura 53. Polipos inflamatorios

Figura 54. Pancolite

Microscopia; inflamação restrita a mucosa, ocasionalmente a submucosa, criptite e atrofia de vilos, abscessos de cripta.

Figura 55. Ulceração superficial

Sugestões de leitura:

  • Cui Y, et al. Microscopic features of small bowel mucosa of patients with Crohn’s disease. BMC Gastroenterol. 2019;19:232. [ texto completo ]
  • Gajendran M, et al. A comprehensive review and update on ulcerative colitis. Dis Mon. 2019;65:100851. [ resumo ]

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Diagnóstico

Conteúdo

Quadro clínico – Doença de Crohn

Varia de acordo com:

  • o caráter da doença: inflamatório, estenosante e/ou fistulizante
  • a localização

Assim um doente que apresenta

  • ileíte estenosante, poderá apresentar dor abdominal em cólica, distensão abdominal, alteração do hábito intestinal , náusea e vômitos;
  • ileíte inflamatória: dor na fossa ilíaca direita (FID), aumento do número de evacuações,

Se o processo inflamatório estiver localizado no cólon distal, poderá apresentar, aumento do número de evacuações com sangue e muco, lembrando um quadro de RCU.

As fístulas na DC podem comunicar a área acometida com estruturas vizinhas e o doente poderá apresentar fístula com

  • bexiga; sintomas de infecção urinária, perda de gases e fezes na micção:
  • pele: apresentará perda de fezes pela parede abdominal
  • vagina: saída de fezes pela vagina

Figura 1. Fístula entero entérica.

A fístula poderá comunicar alças de delgado entre si ou com o intestino grosso. Dependendo da altura da comunicação, o doente poderá apresentar quadro mais ou menos intenso de diarreia e perda ponderal. Fistulas entre intestino grosso e estomago são responsáveis por quadros importantes de desnutrição.

Em todas as situações, o paciente poderá apresentar anorexia, perda de peso, febre, e principalmente cansaço. Este pode se tornar debilitante e constituir em uma das queixas mais importantes do paciente.

 

Quadro clinico – Retocolite ulcerativa

 

Caracteriza-se por aumento do número de evacuações, com sangue e muco. A dor abdominal não é tão significativa quanto no caso da DC. O quadro de desnutrição em geral só ocorre no inicio da doença, estabilizando-se com o passar do tempo. Os sintomas gerais como mal-estar, cansaço, e outros são comuns às duas doenças.

 

 Exame físico

O paciente poderá apresentar-se febril, descorado, com sinais de desnutrição e desidratação. Verificar manifestações extra intestinais  e perianais . Pode apresentar ainda consequências de efeitos colaterais de medicamentos.

Um exame abdominal minucioso e exame proctológico completo são indispensáveis.

Figura 2 Paciente emagrecido, lesões orais, fistulas cutâneas

Diferença do quadro clinico entre jovens e idosos

Os sintomas gerais são os mesmos em jovens e idosos, assim como as opções de tratamento e indicações cirúrgicas, porém devemos nos atentar aos pacientes com idade mais avançada e outras comorbidades associadas para as possíveis interações medicamentosas.

Jovens: pacientes diagnosticados na infância ou na adolescência costumam apresentar doença mais agressiva, mais extensa, refratária ao tratamento, com mais sintomas sistêmicos e impacto no crescimento e desenvolvimento (perda de peso, anorexia, atraso no crescimento e puberdade tardia). Na RCU geralmente iniciam o quadro com uma pancolite. Nesses pacientes, há maior probabilidade de desenvolver câncer pela inflamação que persiste ao longo dos anos.

Idosos: a gravidade dos sintomas é menor, porém o número de internações e a mortalidade é maior em pacientes acima de 65 anos. Nessa faixa etária, os episódios de recorrência são menores, mas quando ocorrem são mais graves. Além da própria doença, temos que acrescentar a morbidade própria da faixa etária, por outras patologias.

Sugestões de leitura

  • del Val JH. Old-age inflammatory bowel disease onset: a different problem? World J Gastroenterol. 2011;17:2734-2739. [ texto completo ]
  • Fuller MK. Pediatric Inflammatory Bowel Disease: Special Considerations. Surg Clin North Am. 2019;99:1177-1183. [ texto completo ]
  • Rogler G. Is inflammatory bowel disease more severe when it appears at younger ages? Digestion. 2010;81:235-236. [ resumo ]

 

Obesidade

Nos últimos anos, observou-se aumento na incidência de sobrepeso e obesidade, assim como no número de pacientes com DII, e uma das justificativas é o estilo de vida ocidentalizado (sedentarismo e dieta rica em gorduras, açúcares e pobre em fibras).

Os obesos têm um risco maior de desenvolver doenças do trato gastrointestinal, incluindo as DII.

Geralmente as DII associam-se à perda de peso, baixo índice de massa corpórea (IMC) e desnutrição, porém alguns estudos recentes mostraram que a obesidade é fator de risco, principalmente para DC, e pode estar associada à progressão da doença, atividade clínica prolongada e resposta clínica prejudicada.

Além disso está relacionada a maior probabilidade de cirurgias e de doença penetrante na DC, e maior probabilidade de recidiva dos sintomas na RCU.

  • Bilski J, et al. Role of Obesity, Mesenteric Adipose Tissue, and Adipokines in Inflammatory Bowel Diseases. Biomolecules. 2019;9:780. [ texto completo ]
  • Emerenziani S, et al. Role of Overweight and Obesity in Gastrointestinal Disease. Nutrients. 2019;12:1 [ texto completo ]

Sugestões de leitura:

  • Bilski J, et al. Role of Obesity, Mesenteric Adipose Tissue, and Adipokines in Inflammatory Bowel Diseases. Biomolecules. 2019;9:780. [ texto completo ]
  • Emerenziani S, et al. Role of Overweight and Obesity in Gastrointestinal Disease. Nutrients. 2019;12:111 [ texto completo ]

 

Manifestações extra intestinais (MEI)

Até 50% dos pacientes com DII apresentam ao menos uma MEI ao longo da vida. Podem ser dependentes ou independentes da atividade inflamatória da doença.

Em 25% dos pacientes a MEI pode preceder o diagnóstico de DII.

É importante diferenciar MEI de uma patologia extra intestinal induzida por medicação.

Principais MEI: articular, cutânea, oftalmologica, hepatobiliar, pulmonar, urológicas, cardiovascular, coagulopatia, tireoidopatia.

  • Articulares: são as mais comuns e geralmente aparecem após o diagnóstico da DII.

Artrites e artralgias: podem ser periféricas e/ou axiais (sacroileíte, espondilite anquilosante).As artralgias periféricas, embora pareçam pouco importantes, podem impedir a carreira de um cirurgião (mãos), pianista (mãos) ou de uma bailarina (joelhos).

Figura 3. Edema articular

 

Caracterizam-se pelo acometimento de uma ou mais articulações. A artrite periférica é migratória e de grandes e pequenas articulações. A articulação acometida apresenta-se quente, dolorosa, edemaciada e os testes para artrite reumatoide apresentam-se negativos

 

Figura 4. Sacroileite e espondilite anquilosante

A espondilite anquilosante é rara, mais frequente em homens. Os sintomas caracterizam-se por dor e limitação dos movimentos. Não há sincronismo com a atividade da doença intestinal e a sintomatologia não se altera após tratamento cirúrgico da doença intestinal.

Osteomielite dos ossos pélvicos ocorre quando fístulas entéricas da região íleocolônica permitem que a flora anaeróbica intestinal chegue à região do psoas.

Figura 5 Fistula retal com coleção pre sacral

A osteoporose é manifestação importante, principalmente em mulheres. Lembrar que muitos pacientes são medicados com corticosteroides e que envelhecem ao longo do tempo, agravando os sintomas.

  • Cutâneas: podem se associar a atividade da doença.

Figura 6. Eritema nodoso

A manifestação dermatológica mais comum é o eritema nodoso. Caracteriza-se por lesões nodulares, múltiplas, dolorosas, hiperemiadas, localizadas preferencialmente na face anterior dos membros inferiores. Correlaciona-se com a exacerbação da doença intestinal e é mais frequente em mulheres.

Figura 7. Pioderma gangrenoso

Figura 8. Sequela de pioderma gangrenoso

O pioderma gangrenoso é manifestação grave e pouco comum. Inicia-se como acne, com eliminação de secreção com aspecto purulento, mas estéril, que rapidamente evolui para necrose ou gangrena da porção central da lesão. A lesão típica caracteriza-se por úlcera necrótica, dolorosa, com bordos elevados, circundada por área violácea que se dilui em eritema distalmente. Pode ocorrer em qualquer área do corpo. Correlaciona-se mais frequentemente com envolvimento colônico. Pela correlação com a exacerbação da doença e pela dificuldade de controle pode corroborar a indicação para tratamento cirúrgico da doença intestinal. A cicatrização das lesões deixa sequelas importantes. No caso da foto, houve perda de mobilidade da articulação impedindo a deambulação. Foram necessárias 3 operações para retirar a fibrose e mesmo assim a marcha permaneceu alterada.

Figura 9. Psoriase

A psoríase pode se apresentar como MEI e como reação adversa ao tratamento com Infliximabe (psoríase paradoxal), acometendo principalmente região palmo-plantar e couro cabeludo. Este diagnóstico diferencial é importante. A não identificação da psoríase palmo-plantar como efeito colateral do anti-TnF pode levar ao agravamento do quadro se não houver interrupção do medicamento.

Em mais da metade dos casos publicados, as lesões orais precedem o aparecimento de outras alterações no trato digestivo por meses ou anos. A lesão mais comum é a úlcera aftóide e sua biópsia pode demonstrar a presença de granulomas. A mucosa bucal apresenta-se com aspecto calcetado, com pregas lineares e hiperplásticas e úlceras. Os lábios podem estar endurados e edemaciados.

Figura 10. Ulcera aftoide e queilite

Manifestações inespecíficas, como halitose, disfagia, fissura oral, líquen plano, alterações do paladar podem ocorrer.

A síndrome de Sweet é uma dermatose de inicio súbito, com placas eritematosas ou nódulos, vesículas e pústulas dolorosas. A associação com doença de Crohn é pouco frequente.

Figura 11. Paciente com síndrome de Sweet

 

Figura 12. Doença de Crohn em região umbilical

Figura 13. DC de pele em região abdominal e coxa em paciente previamente submetida a proctocolectomia total

A doença de Crohn metastática (DCM) é condição rara, definida como lesão granulomatosa de pele não contígua com trato gastrointestinal. Em geral, aparece muitos anos após a instalação da doença de Crohn e para que seja definida como DCM é necessário que a histologia comprove processo inflamatório com granulomas não caseosos.

Medicamentos empregados no tratamento podem determinar lesões dermatológicas.

Figura 14. Herpes Zoster

Figura 15. Reação a mesalazina

Figura 16. Reação a sulfasalazina

Figura 17. Reação a corticosteróides

Figura 18. Paciente com psoríase palmo plantar

  • Oftalmológicas:

Entre as várias manifestações oculares descritas na doença de Crohn, a mais temida é a uveíte. É mais comum na colite de Crohn e em mulheres. Os sintomas consistem em dor, turvação da visão, fotofobia, cefaleia, os olhos ficam hiperemiados e o exame com lâmpada de fenda permite a identificação de precipitados na córnea. É importante frisar que a perda da visão pode ser mais importante para o paciente do que quadros esporádicos de diarreia.

Figura 19. Uveíte

  •  Hepatobiliar:

Colangite esclerosante primária (CEP). Incomum, é uma doença colestática crônica que causa estenoses nas vias biliares, e segue curso independente da DII, podendo progredir para cirrose com indicação para transplante hepático. Os pacientes com CEP têm maior risco de câncer colo retal (CCR) e colangiocarcinoma.

Figura 20 Colangite esclerosante primaria

Transplante hepático é o único tratamento eficaz. Tempo médio do diagnóstico da CEP para o transplante é de 20 a 25 anos, e o risco de rejeição é maior em quem tem DII, assim como a probabilidade de recidiva da CEP também é alta.

Outras manifestações hepatobiliares: Esteatose hepática, colelitíase (DC), trombose de veias hepática e porta.

  • Urologicas: nefrolitíase (mais comum), e as doenças renais parenquimatosas (raras – glomerulonefrite ou nefrite túbulo intersticial), fístulas do trato digestivo com ureter ou bexiga na doença de Crohn.

Figura 21 Fistula entero vesical

 

  • Doenças cardiovasculares: predisposição a aterosclerose prematura e doença arterial coronariana – infarto agudo do miocárdio (IAM), acidente vascular cerebral (AVC), isquemia mesentérica.
  • Doenças pulmonares: pneumonia intersticial, associação com doença pulmonar obstrutiva crônica (DPOC).
  • Coagulopatias: Tromboembolismo venoso (TEV) (risco 2x maior quando doença em atividade)

Mais comuns: Tromboembolismo pulmonar (TEP) e Tromboembolismo venoso periférico (TVP).

  • Doenças da tireoide: Tireoidite de Hashimoto ou tireoidite autoimune, mais associada em pacientes com RCU e outros distúrbios autoimunes. Sem relação com a atividade da DII.
  • Outras MEI já foram descritas, porém mais raras.

Figura 22 DC em orelha

 

 

 Sugestões de leitura:

  • Bernstein CN, et al. The Impact of Inflammatory Bowel Disease in Canada 2018: Extra-intestinal Diseases in IBD. J Can Assoc Gastroenterol. 2019;2(Suppl 1):S73‐S80. [ resumo ]
  • Harbord M, et al, for the European Crohn’s and Colitis Organisation [ECCO], The First European Evidence-based Consensus on Extra-intestinal Manifestations in Inflammatory Bowel Disease, Journal of Crohn’s and Colitis, Volume 10, Issue 3, March 2016, Pages 239–254. [ texto completo ]
  • Hedin CRH, et al. The Pathogenesis of Extraintestinal Manifestations: Implications for IBD Research, Diagnosis, and Therapy. J Crohns Colitis. 2019;13:541‐554. [ resumo ]
  • Iravani S, et al. An update on treatment options for primary sclerosing cholangitis. Gastroenterol Hepatol Bed Bench. 2020;13:115‐124. [ texto completo ]
  • Kim YN, et al. Renal and Urinary Manifestations of Inflammatory Bowel Disease. Korean J Gastroenterol. 2019;73):260‐268. [ resumo ]
  • Kim YS, et al. Musculoskeletal Manifestation in Inflammatory Bowel Disease. Korean J Gastroenterol. 2019;73:276‐284. [ resumo ]
  • Lauritano D, et al. Prevalence of Oral Lesions and Correlation with Intestinal Symptoms of Inflammatory Bowel Disease: A Systematic Review. Diagnostics (Basel). 2019;9:77. Published 2019 Jul 15. [ texto completo ]
  • Ribaldone DG, et al. Risk factors of suspected spondyloarthritis among inflammatory bowel disease patients. Scand J Gastroenterol. 2019;54:1233‐1236. [ resumo ]
  • Shizuma T. Concomitant Thyroid Disorders and Inflammatory Bowel Disease: A Literature Review. Biomed Res Int. 2016;2016:5187061. [ texto completo ]
  • Thiebault H, et al. Paradoxical articular manifestations in patients with inflammatory bowel diseases treated with infliximab. Eur J Gastroenterol Hepatol. 2016;28:876‐881. [ resumo ]

 

 

 DC perianal

A DC perianal representa um fenótipo grave da doença e inclui plicoma inflamatório, fistula, abscesso, fissura, úlcera, estenose e incontinência anal. Também pode ocorrer doença hemorroidária associada. Acomete mais comumente portadores de doença colônica e retal e em pacientes com diagnóstico em idade jovem.

Ao quadro clínico geralmente se associam dor, sangramento, drenagem de secreção purulenta e incontinência anal.

A avaliação diagnóstica é feita com anamnese, exame físico anorretal, colonoscopia e estudo radiológico do intestino delgado. Eventualmente, em caso de dor importante, o exame físico deve ser feito sob sedação. Em casos específicos de abscessos e fístulas, a RNM e o USER podem ser solicitados.

  1. Plicomas inflamatórios

Manifestação comum, podem ser únicos ou múltiplos. Geralmente se associam a linfedema, fístulas ou fissuras. Causam dor e dificuldade de higiene.

Figura 23. Plicomas inflamatórias

 

  1. Fístulas anorretais

Figura 24. Fistula perianal

É a complicação mais comum da DC perianal.  A apresentação tende a ser mais oligossintomática com eventual drenagem de conteúdo mucoso ou purulento. Podem ser simples ou complexas

  • Simples: Interesfincteriana ou transesfincteriana baixa e com trajeto curto e único;
  • Complexas: Múltiplos orifícios internos e/ou externos

O diagnóstico é feito clinicamente. Entretanto, exames radiológicos (RNM e US) podem ser úteis em excluir presença de abscessos, estudar a relação com o complexo esfincteriano e planejar o melhor tratamento.

  1. Abscessos anorretais

Figura 25. Abscesso anorretal

Podem ocorrer tanto devido a obstrução do trajeto fistuloso anorretal quanto à infecção criptoglandular. Os sintomas mais comuns são dor anal constante, febre e calafrios.

Em casos de abscessos perianais e isquiorretais o diagnóstico é facilmente estabelecido com o exame físico através da presença de eritema e edema. Entretanto, abscessos interesfincterianos e supraelevadores podem necessitar de RNM para elucidação diagnóstica.

  1. Fissuras

Figura 26. Fissura anorretal 

Podem ser típicas, na linha média anterior ou posterior, e atípicas, nos quadrantes laterais. Estas são mais frequentes. Usualmente são múltiplas e com base granulada com bordos edemaciados. Muitas vezes as fissuras são indolores. Há perda de secreção, prurido e sangramento.

  1. Úlceras

Podem ser extensas, profundas e múltiplas.

Figura 27. Ulceras anorretais

  1. Estenose anal

A inflamação crônica pode levar a fibrose seguida de estenose. Sintomas típicos são dificuldade evacuatória, tenesmo, incontinência e urgência evacuatória.

  1. Incontinência anal

Frequente em doença avançada, na presença de múltiplos trajetos fistulosos, abscessos com sepse local, úlceras profundas com destruição de tecido ou em decorrência de operações mal conduzidas.

Figura 28. Destruição do esfincter

  1. Hemorroidas

Os pacientes com DC podem desenvolver quadro de doença hemorroidária. Entretanto não é comum e o tratamento conservador deve ser o tratamento de escolha.

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Aspectos Gerais

Conteúdo

Doença inflamatória intestinal (DII) é um termo utilizado para descrever principalmente duas condições: Doença de Crohn (DC) e Retocolite Ulcerativa (RCU). Existem muitas teorias sobre a possível etiologia das DII. Fatores genéticos, ambientais, microbiota intestinal geralmente são citados nas teorias.  A etiologia permanece desconhecida, não tem cura, mas tem tratamento. Nem sempre é possível diferenciar uma da outra.

Ambas as doenças são crônicas, atingem jovens e evoluem com episódios de remissão e exacerbação. Causam impacto na qualidade de vida e seu tratamento é dispendioso levando a problemas socioeconômicos importantes.

A DC pode acometer todo o tubo digestivo, sendo mais prevalente no ileo terminal, atinge todas as camadas do intestino (transmural) sendo o acometimento salteado. Devido ao aspecto transmural da lesão, o paciente pode evoluir com fistulas e estenoses.

A RCU caracteriza-se por acometer apenas o intestino grosso, de forma continua, com gradiente ascendente a partir do reto, limitando-se a mucosa e submucosa.

Histórico

Alfredo O Grande (849 – 899 dc), o primeiro Rei da Inglaterra, poderia ter tido DC. Ao longo dos anos, foram feitas várias descrições compatíveis com a doença, Moynihan (1907), Mayo-Robson (1908) e Dalziel (1913). A doença só ficou caracterizada a partir da descrição por  Burrill Crohn, Leon Ginzburg, e Gordon Oppenheimer em 1932. Na época, foi denominada ileíte terminal por se acreditar que seria restrita a esta área do intestino. A partir do momento em que se verificou que a doença poderia se manifestar em outras áreas do corpo, optou-se por mudar seu nome para doença de Crohn.

Hipócrates descreveu um quadro clinico que cursava com diarreia crônica e fezes com sangue. Supõe-se que essa condição estivesse relacionada com ulcerações e inflamação do colon. Várias descrições sugestivas de RCU foram feitas ao longo do tempo. Mas foi a partir de 1875 que a descrição da doença por Wilks e Moxon, caracterizou a doença.

Epidemiologia

As DII são mais comuns nos países industrializados, particularmente na América do Norte e Europa Ocidental, embora sua incidência venha aumentando na Ásia e América do Sul. Atinge ambos os sexos, com discreto predomínio do sexo feminino. É mais frequente em jovens, entre a segunda e terceira década de vida. mas já se verifica um segundo pico de incidência na sexta década.

Nossa capacidade de diagnóstico tem aumentado nos últimos anos. Não chega, no entanto, a justificar o expressivo aumento verificado na incidência da doença na maioria dos países.

Etiologia

Considera-se que a DII é resultado de um conjunto de fatores: genéticos, ambientais, imunológicos. Tem se dado ênfase ao estudo da microbiota intestinal. Apesar de todos os avanços nestas diversas áreas do conhecimento, ainda não se conseguiu explicar como a doença se instala e perpetua.

Sugestões de leitura:

  • Crohn Disease: Epidemiology, Diagnosis, and Management Feuerstein, Joseph D. et al. Mayo Clinic Proceedings, Volume 92, Issue 7, 1088 – 1103 2017 [ texto completo ]
  • Dahlhamer, J.M. et al. Prevalence of inflammatory bowel disease among adults aged≥ 18 years—United States, 2015. MMWR Morb Mortal Wkly Rep. 2016; 65: 1166–1169 [ texto completo ]
  • Loftus, E.V. Jr. Clinical epidemiology of inflammatory bowel disease: incidence, prevalence, and environmental influences. Gastroenterology. 2004; 126: 1504–1517 [ resumo ]
  • Molodecky, N.A. et al. Increasing incidence and prevalence of the inflammatory bowel diseases with time, based on systematic review. (e42; quiz e30) Gastroenterology. 2012; 142: 46–54 [ resumo ]
  • Torres J, Mehandru S, Colombel JF, Peyrin-Biroulet L. Crohn’s disease. Lancet. 2017;389(10080):1741‐1755. [ resumo ]

 

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